Capítulo 8 –
O carro aparentava ser de fuga, mas não. Era apenas o automóvel do tenente Carlos Henrique, que dirigia a toda velocidade com olhos concentrados na direção e ouvidos atentos às palavras de Fred, o jovem assassino que fora solto através da condição de levar o homem ao cativeiro onde estariam supostamente os corpos de Thalita e Aline – o que na verdade era mentira.
- Eu espero que não esteja mentindo para mim, garoto – resmungou Carlos, encarando-o seriamente enquanto o carro percorria uma pista reta – Eu estou soltando você apesar de todas as barbaridades que cometeu, mas não cometerei esse erro novamente se você pisar na bola comigo.
O olhar de Fred era sereno, tão calmo e inocente quanto o de um bebê. O sorriso queria escapar de seus dentes, mas ele se continha. Não queria ver Carlos mais furioso do que já estava.
- Não se preocupe, estamos chegando lá. Agora vire à direita. Estamos saindo da cidade – disse ele, enquanto observava a paisagem afora.
Carlos assentiu com um ar de desconfiança e fez o trajeto. Ficou um pouco irritado quando o garoto explicara que estavam saindo da cidade. Afinal, ele era policial e aquilo fora como um insulto à sua inteligência.
O problema era saber onde eles estavam indo agora.
Aline tossia sem parar. Sua garganta aparentava estar a ponto de explodir. A cada tosse emitida, sangue jorrava pela boca, manchando suas vestes ou tudo o que estava próximo. Ela agonizava, fechava os olhos, tentava reprimir-se daquilo, mas a doença era maior.
O tempo estava acabando.
Ao seu lado, Lucas a observava com olhos tristes e cheios de pena. Ele não podia fazer nada. Aliás, ele podia e faria: Seria o cirurgião que faria o difícil transplante de coração. Substituiria o órgão de Aline pelo de Thalita e, se tudo desse certo – se desse – Aline iniciaria uma nova vida, com um novo coração.
- Calma Aline. Tudo vai ficar bem – disse ele, pondo a mão sobre as costas da garota.
- O tempo... Argh! O tempo está... Acabando, Lucas... Está acabando...
Lucas assentiu, sorriu e disse:
- Não mais. A hora chegou, amor. Vamos te salvar. Eu juro.
Aline abriu os olhos e sorriu.
Agora vamos ser apenas uma, Thalita. Apenas... Uma, pensou ela, enquanto o sangue misturado a saliva escorria de sua boca.
As árvores totalmente agrupadas davam a sensação de um lugar abandonado pela civilização. A estrada era extensa, repleta de pedras e buracos. As inúmeras folhas balançavam através da ventania suave e Carlos podia começar a sentir cheiro de podridão, carniça...
- Puta que pariu! Que cheiro é esse?! – Questionou num tom de exclamação, diminuindo a velocidade do automóvel e elevando uma de suas mãos ao nariz para evitar o terrível odor.
- Eu estou acostumado com isso – respondeu Fred, agora com uma aparência mais séria estampada em seu rosto. Sabia que já estavam chegando ao local e o mau-cheiro era a prova disso – Eles jogam os restos corporais no meio dessas florestas. As pessoas não vêem aqui. Ninguém vem aqui. Fica mais fácil se livrar dos corpos.
- Entendo... – o silêncio pairou sobre aquele carro. Carlos observou Fred e, enquanto o encarava, perguntava-se o porquê daquele jovem ter se tornado um serial killer. Logo, o silêncio foi tomado por suas palavras – Como pode você ser tão novo e já se mete em tantas confusões? Por que, garoto? Você é tão jovem... Sua vida poderia ser bem diferente dessa, sabia? Por que seguiu os passos do seu pai, ao invés de denunciá-lo a nós quando pôde?
Fred não olhou para o policial mas, ainda observando a paisagem, respondeu friamente:
- É como dizem por aí: Tal pai... Tal filho...
- Mas não faz sentido... Não faz... Vocês não podem se tornar assassinos sem mais nem menos! Não há explicação para isso!
- A vida é um mistério sem explicações, Carlos. As coisas simplesmente acontecem como devem acontecer. Não há explicação para isso.
- Eu discordo... – sussurrou o tenente, tendo em mente lembranças passadas.
- Opiniões diferentes... A questão é que temos segredos ocultos que não podemos revelar à ninguém – disse Fred – Você também tem cara de quem fez algo errado na vida...
- Isso não é da sua conta! E os meus segredos são problema meu! – Exclamou e aumentou a velocidade do automóvel, tentando fechar de vez aquela conversa.
Fred calou-se de repente. Fixou seus olhos em um pequeno objeto que estava escondido dentro do carro e disse:
- Na verdade, eu tenho um segredo que acho que posso lhe contar...
Atento aos buracos na estrada, Carlos perguntou distraidamente:
- Que segredo?
- Odeio policiais! – Exclamou o garoto, capturando uma caneta e rapidamente perfurando um dos olhos do policial que, agonizando, perdeu o controle do carro, fazendo-o sair da estrada de terra.
Enquanto o automóvel descia uma ladeira, batendo sobre os galhos das árvores, Fred aproveitou a chance e pulou do banco, caindo bruscamente contra o chão, ralando suas costas.
Enquanto se levantava, pôde ver o carro continuando a descer sem parar, em direção a um lugar desconhecido de longe dali.
Sorrindo e mesmo com alguns ferimentos, ele disse:
- Eu jamais voltarei àquela maldita cadeia, seu filho da puta!
Aline estava em cima de uma mesa, inconsciente. Ao seu lado uma pequena máquina que contava seus batimentos cardíacos estava ligada. A sala era pequena. Na verdade, era um quarto – o mesmo onde Roberto morrera, pois as manchas de sangue ainda estavam tintadas sobre os lençóis brancos.
As luzes acenderam alguém entrou pela porta e disse num tom baixo e suave:
- Oi Aline, como você está?
A estranha pessoa vestiu as luvas brancas de látex.
- Não se preocupe, esse sofrimento acabará logo...
Ao lado do leito onde Aline se encontrava, vários objetos de cirurgia enchiam a pequena mesa.
Pegando um bisturi e colocando-o de frente para seu rosto – fazendo o reflexo surgir no objeto – Lucas disse:
- A hora chegou, Aline...
Ele sorriu e, ao mesmo tempo, lágrimas escorreram de seus olhos.
De repente, virou-se de costas para a garota e deparou-se com outro leito...
O leito onde se encontrava outra pessoa inconsciente...
Outra garota:
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