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sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Ceia de Natal - por Valdir Luciano


        

Os sinos em breve tocariam alegremente. A árvore de Natal, um pinheiro, tinha um tom verde reluzente; porém, ainda não estava decorada. Na TV, passava um desenho animado que também celebrava a data.
As luzes iluminavam a sala de estar, e a trilha sonora era alta o suficiente para cobrir certos sons. Certos e estranhos sons que vinham de um aposento não muito longe dali. Na verdade, há apenas alguns metros dali... Na cozinha.
Os gritos eram bloqueados pelo pano úmido de sangue, amarrado contra a boca daquela mulher. Ela estava em cima da mesa, presa por grossos cordões, seu corpo nu exposto. Os seios, o umbigo e a vagina estavam feridos e o couro cabeludo fora arrancado com brutalidade.
Simone, a vítima, arregalava os olhos e forçava a garganta para gritar com todas as suas forças. No entanto, o único som que saía era um gemido abafado e angustiante de uma mulher torturada sem piedade...
Sem motivos.
De repente, os pés de alguém surgiram caminhando em sua direção. Pertenciam a uma idosa. Ela segurava uma enorme faca de cozinha, vestia um avental branco que já não estava tão branco assim e possuía uma horrível aparência. O rosto era deformado, com sobrancelhas grossas, e assustadoramente enrugado, a dentição, podre e apenas os caninos estavam inteiros.
Simone remexeu-se de agonia, tentando escapar, gritar, dizer algo...
Xiiiiu... sussurrou a velha após colocar os dedos sobre os lábios. Está quase na hora, amor...
E estava mesmo. Eram exatas onze e 48 da noite. Os fogos iriam iluminar o horizonte, visto pelas janelas da pequena casa de tijolos, afastada da cidade. À sua frente, apenas uma estrada de terra. Ao lado, um veículo de cor rosa com os quatro pneus furados e a parte da frente destruída: o carro de Simone.
Na cozinha, a senhora juntou as cadeiras ao redor da extensa mesa de jantar. Em alguns segundos, duas crianças surgiram animadas uma menina e um menino , perguntando aos berros:
VAMOS COMER, MÃE? VAMOS COMER?
Claro, amores a idosa respondeu, enquanto afiava a faca. — Daqui a pouquinho. Vamos esperar o pai de vocês chegar, tudo bem?
As crianças assentiram.
Na TV, os sinos começaram a tocar.
O Natal estava prestes a ser celebrado.
Simone continuou se debatendo, mas todos os seus atos eram em vão. A idosa, encarando-a sorridente, arrancou o pano de sua boca. E, então, Simone gritou:
NÃAAAAAAAAAAAAAAAO!! NÃAAAAAAAAAAAAAO! POR FAVOR, POR FAVOR, POR FAVOOORR... DEUS... POR QUE ESTÁ FAZENDO ISSO COMIGO, SENHORA? POR QUÊ?! POR QUÊ?!
É Natal, meu anjo... ela respondeu. E, com a ponta da lâmina, tocou de leve o umbigo da vítima.
MÃE, MÃE, MÃE! EU QUERO A CABEÇA! o menino gritou.
Não, filho. A cabeça nós iremos pendurar na árvore depois...
Os olhos de Simone cintilaram e ela sentiu vertigem. Começou a vomitar.
De repente, a idosa ergueu a faca, mirou o espaço entre os seios da vítima e a golpeou. O sangue fluiu de imediato. Simone passou a tremer. Seus gritos tornaram-se mais altos. Pedia pela misericórdia de Deus, que aparentava não estar ali para salvá-la.
As crianças pulavam de alegria. Quando o sangue escorreu da mesa e atingiu o chão, elas avançaram para lambê-lo.
Não bebam tudo... disse a idosa, escolhendo um dos seios para vítima para apunhalar. Depois faremos um belo panetone com o que sobrar do sangue dela.
As crianças esfregavam-se no sangue e o lambiam como se ele fosse uma guloseima. Neste instante, um homem entrou no local. Trazia um grande saco preto, de plástico.
Após receber mais uma facada, Simone entrou em estado de choque e depois em convulsão. A baba escorria de sua boca e as lágrimas espalhavam-se por seu rosto.
Cheguei, amor disse o homem.
A seguir, ele colocou o saco no chão e o abriu. De seu interior, tirou pernas, braços, órgãos, cabeças... Com cuidado, deixou tudo sobre a mesa, ao lado do corpo quase sem vida de Simone.
A idosa largou a faca sobre a pia e, na sequência, retirou de um dos armários uma enorme e pesada marreta. Com ela, socou a cabeça de Simone. O impacto explodiu seus olhos e fez os ossos saltarem da pele e carne.
Depois levantou novamente a marreta... E bateu. Ergueu e bateu. Ergueu e bateu várias vezes... Até que o crânio da vítima se abriu e o cérebro, transformado numa gosma nojenta, desceu lentamente pelas laterais da cabeça.
O jantar está servido! — a idosa avisou. Foi aplaudida com euforia.
O relógio marcou meia-noite.
Distantes, os fogos de artifício subiram ao céu, os animadores da TV desejaram Feliz Natal, e aquela família rapidamente sentou-se ao redor da mesa farta. Cheia de sangue, tripas e gosmas irreconhecíveis ao ser humano.
Era um banquete.
O banquete do inferno.
Garfos e facas a postos. A idosa preferiu uma das coxas, o homem escolheu o seio que permanecera intocado e as crianças queriam tudo e mais um pouco. Logo havia carne fresca na boca, mastigada de modo faminto e apressado.
Mãe, me passa as tripas! exigiu o menino.

...

O dia amanheceu nublado, mas bonito. Na estrada de terra, uma caminhonete vinha em ritmo lento.
As árvores estavam à direita e à esquerda, numa atmosfera densa e verde. Ele avistou, adiante, uma pequena casa de tijolos, rodeada por cercas de madeira.
O automóvel parou de repente.
PORRA! gritou César, o motorista, irritado.
Ele saiu e observou os pneus: tinham sido perfurados por finos pregos deixados na estrada. Olhou para o céu e questionou-se do porquê de tudo aquilo estar acontecendo exatamente no dia de Natal.
O jeito era pedir ajuda. Em frente à casa de tijolos, ele bateu palmas.
Ninguém apareceu.
Bateu novamente e, em seguida, uma idosa abriu a porta.
Posso ajudar, moço?
Acho que pode. Os pneus do meu carro estão furados, me esqueci de recarregar a bateria do celular e preciso chamar o guincho. Vocês têm telefone?
O silêncio pairou sobre o lugar. A mulher mostrou-se pensativa. Ao seu lado, um homem surgiu e cochichou algo em seu ouvido. Na sala, duas crianças um menino e uma menina corriam em volta da grande árvore de Natal agora decorada. Braços e pernas estavam amarrados nos galhos, sangue coagulado fazia as vezes de neve, misturando-se ao verde do pinheiro, e várias cabeças estavam penduradas como se fossem bolinhas coloridas. Entre elas, estava a de Simone, cujos olhos mantinham-se abertos e vidrados.
Simpática, a idosa acenou para César.
Sim, pode entrar!
Ele foi convidado para o almoço... Só não sabia que seria a própria refeição.
Assim que entrou na casa, a porta se fechou atrás dele.
Feliz Natal.
FIM.

Escrito por Valdir Luciano, 2011

                 

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