Capítulo 9 –
Eu estava completamente ansioso para ir a pré-escola. Imaginava como seria: Um monte de pessoas brincando com seus carrinhos, bonecos, correndo livremente, fazendo o que bem quisessem... Enfim, um mundo livre – um sonho.
E todo o dia importunava a minha mãe, perguntando quando começariam as aulas, e ela sempre dizia a mesma coisa:
- Calma, Valdir, logo-logo as aulas começam!
- Mas quando?
- Logo!
- Logo quando?
Minha impertinência chegava até certo – alto, crítico, insuportável – ponto que a Senhora Diomar já não respondia absolutamente nada, apenas contando até dez e esperando que eu parasse de provocá-la, senão eu acabaria levando um prêmio por tudo aquilo – um prêmio doloroso, que jamais gostaria de receber. Eu percebia sua irritação e, rapidamente, fechava a matraca.
Mas era impossível guardar tanta ansiedade quando se via Márcio e Tânia chegarem do colégio, com aquelas mochilas enormes nas costas, repletas de acessórios de estudo. Meu olho era tão grande que eu abria as mochilas escondido, para ver o que eles faziam na escola. Abria os cadernos e encontrava aqueles rabiscos ilegíveis para mim e ficava imaginando o que poderia estar escrito, acabando por obter a vontade de escrever também.
A programação na T.V já não me interessava mais. Eu já não queria sair mais para brincar na rua com os meus amigos e ficava trancado dentro de casa, com testa franzida, fazendo bochecha e cara de mau, tentando chamar atenção da minha família, para que pudessem me levar logo ao presinho.
Durante os dias, sentava á mesa e rabiscava uma folha com o lápis que meu irmão usava. Apenas parecia estar criando aquelas artes estranhas que tanto fazem sucesso por aí, com linhas tortas, caricaturas horríveis... Ainda me pergunto por que essas coisas fazem sucesso...
Maldita ansiedade que eu tinha naquela época! Mas é normal. Quando somos crianças, se sabemos que haverá algo grandioso e que nos interessa vindo por aí, sempre desejamos que seja logo, que seja amanhã, que seja hoje, agora. Mas nem tudo que queremos é o que haverá de acontecer, ainda mais na hora que quisermos. Mas nem pensamos nisso quando pequenos. Apenas fazemos birra, choramos, rastejamos, pulamos, fingimos estar morrendo, atiramos coisas ás paredes, tentamos fugir de casa... Enfim, fazemos de tudo até que nossos pais façam milagre e nos dêem o que desejamos.
Em alguns dias, aprendi a escrever o meu nome com a ajuda do Márcio. Realmente os dias de estudo estavam chegando em minha vida. Eu tive certeza disso quando minha mãe me levou para fazer a matrícula na escolinha. Á primeira vista, um lugar pequeno, não muito bonito, mas para eu e os outros pequeninos era um palácio de diversão. Atrás da recreação havia um campo de futebol e, ao lado, o posto de saúde do bairro. E mais acima, a famosa escola Kakunosuke Hasegawa – o lugar onde, futuramente, eu estudaria.
Meu grande amigo, Salomão, havia me dado de presente um kit de estudo do Batman, que incluía: dois lápis pretos, duas canetas pretas e azuis, duas borrachas e um boneco do homem morcego – que dava para encaixar sobre o lápis. Eu não era muito fã daquele herói, mas gostei muito do presente. Foi o meu primeiro material escolar que havia ganhado, mas haveria mais.
Minha mãe fora ao centro de Itaquá e comprou os cadernos e a mochila – que eu, particularmente, havia odiado: Era colorida, pequena e com um ursinho no meio -. Mas a minha ansiedade de estudar era maior que todos os materiais que eu não havia gostado, e eu certamente estava pronto para começar aquela nova fase da vida.
Nova fase. Sim. Uma nova e misteriosa fase de nossas vidas que passamos, passaremos e haveremos de passar – digo a todos em geral -. É inevitável. Vamos esbarrar com esse mundo paralelo, conhecer novas vidas, iniciar amizades, inimizades, brigar, namorar... É algo simplesmente incrível. É o engate para o futuro que haveremos de ter.
Eu estava ansioso, muito ansioso, mas com medo. O medo do que poderia encontrar nesse novo caminho. Medo de ter de enfrentar obstáculos inevitáveis. Medo de afastar-me da família e dos amigos.
Eu não tinha nem idéia do que o futuro me reservava. Não sabia, ao menos, o que queria ser daqui pra frente. Mas o destino sabia, e começava a mover as peças. Peças importantes e essenciais, que mudariam a minha vida... Para sempre.
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