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sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Livro Negro, O


 

- Você já ouviu falar na lenda do Livro Negro? – perguntou Roger, o zelador – Aquele que fora escrito por um bruxo possesso de magia negra. Quem o ler sofrerá conseqüências fatais: Terá a morte mais agonizante, mais cruel e mais sangrenta que alguém pode imaginar.
- Roger, isso é apenas uma lenda – exclamou David, não acreditando no que o seu companheiro de trabalho havia dito.
- Pode até ser, mas eu já presenciei várias vezes a aparição do livro, ao lado do túmulo de Edward Robinson: O bruxo.
- Bem, seja lenda ou não, eu não acredito em livros amaldiçoados – disse David, pegando suas coisas e saindo pelo portão daquele vago cemitério – Hoje à noite, quando eu vier cuidar do cemitério, me lembrarei dessa sua lenda idiota e vou rir muito.
Ele entrou em seu carro e foi para sua casa, enquanto o zelador observava o túmulo de Edward.
Espero que ele não veja o que eu vi, pensou o homem.
Horas depois, as nuvens se ajuntaram, os raios e trovões iluminavam e estremeciam o cemitério onde David caminhava pelas tumbas, cuidando do lugar. Eram nove horas da noite. O céu estava escuro, mas, de vez em quando, era clareado pelos fortes relâmpagos. O vento assoprava impiedosamente, indicando que a qualquer momento poderia iniciar-se uma tempestade.
Após passar por vários túmulos, iluminando-os com uma lanterna, ele se deparou com aquele que o fizera refletir nas palavras do zelador: O túmulo de Edward Robinson – um bruxo que fora condenado à pena de morte, após ser acusado de matar cerca de trinta pessoas, vítimas de magia negra e práticas de vodu, no ano de mil novecentos e noventa.
De repente, um forte raio caiu sobre o cemitério. David percebeu um estranho vulto atrás de si, assustando-o.
Ao virar-se para ver o que era, aliviou-se: Era apenas um gato.
Porém, não era um gato qualquer. Para sua surpresa, era um gato preto – sinal de azar -. De início, o homem o encarou como se o bichano fosse uma espécie de praga, acreditando nas crenças do povo. Mas logo refletiu.
Gato preto. É apenas um maldito gato, nada mais. É um animal e não uma praga, pensou. O gato, por sua vez, miou de uma maneira tão irritante, como se estivesse morrendo.
Num instante, um segundo raio e, mais uma fez, um segundo vulto atrás de David que, ao virar-se, saltou e gritou: Uma capa escura, com um símbolo de pentágono no meio, manchado a sangue. Sangue de um bruxo.
Sim. Era ele. O temido livro de Edward Robinson estava encostado ao lado de seu túmulo, de onde larvas asquerosas e nojentas começavam a surgir.
As nuvens começaram a ficar num tom avermelhado, o vento dobrara sua força e os raios caíam em grandes proporções. Parecia uma reação em cadeia. David ainda não estava acreditando que aquele era o livro de um bruxo. Mesmo tentando descobrir como aquilo veio parar no cemitério, a curiosidade manifestou-se em si e suas mãos estavam prestes a tocar aquele objeto quando, repentinamente, as larvas subiram nela.
O homem começou a sacudir suas mãos, enojado e com gastura daquelas malditas pragas, que cobriam totalmente o livro, como se fizessem parte da capa.
Retirando um inseticida do bolso, o homem começou a atirá-lo nos vermes, matando-os e capturando o livro, afastando-se rapidamente do local. Ao mesmo tempo, uma voz infernal – vindo das profundezas daquele cemitério – gritava sonoramente. David não conseguia deduzir se tudo aquilo fora culpa de sua mente, ou se era verdade.
Em pânico, ele corria desesperadamente para fora do cemitério, enquanto os reflexos dos anjos e querubins de concreto davam ao lugar um cenário de terror, sendo iluminados pelos relâmpagos.
Entrando em seu carro, David o manobrou e dirigiu em direção a sua casa. Ele não percebera, mas a cada quilômetro que ele percorria, o céu era consumido pelo estranho avermelhado, deixando-o cada vez mais parecido com o inferno. As pessoas que olhavam pelas janelas de suas casas achavam que era o fim do mundo.
Ao chegar a sua casa, o homem pegou o livro, foi até a sala, ascendeu à lareira e começou a ler: Na primeira folha ele continha o nome do autor – Edward Robinson -.
Um grande estrondo: Era o início de uma tensa tempestade.
A cada parágrafo lido, um raio caía em sincronia sobre a terra. As palavras que continham naquele livro eram terríveis e abomináveis: Várias histórias sobre as mortes ocorridas e planejadas pelo bruxo. Uma delas chamou a atenção de David, que começou a lê-la em voz alta:

Oh, Devon, Mestre da magia negra e de todo mal. Ouve-me e atenda-me!
Faças a comida transformar-se em verme! Faça as águas queimarem como o fogo! Faça com que os olhos queimem-se! Faças com que, antes da morte, consigas deparar-se a própria face da mesma! Faças com que, antes da morte, a minha sepultura se abra e o meu cadáver o veja sofrer!
Eu lhe imploro que todas essas cousas caiam em cima daquele que ler este livro, e para completar a maldição deixarei uma mancha de sangue tirado do meu próprio corpo, como uma reverenda!
Ao fechar este livro, juro que tudo o quanto escreveste se tornará cumprida sobre a vida daquele que o ler...

David fechou o livro, aterrorizado.
O fogo da lareira se apagou de repente. Num instante, uma lembrança lhe veio a cabeça: “Quem ler este livro sofrerá as conseqüências fatais...”. Ele começou a ficar amedrontado e, rapidamente, atirou o livro dentro da lareira que estava apagada.
- Não. Eu não posso acreditar no que aquele maldito zelador disse – teimava – Bruxaria não existe!
Indo para a cozinha, David prepara um lanche para se distrair de todos aqueles acontecimentos. Antes de morder o sanduiche, ele lembra-se de uma frase do livro: “... Faça a comida se transformar em verme...”.
Ele riu. Eu devo estar ficando louco, disse a si mesmo.
Ele mordeu o sanduiche e, ao mastigar duas vezes, sentiu várias coisas estranhas e gosmentas se mexendo em sua boca: Uma larva cai de seus lábios e, então, o homem percebe que sua boca e o sanduiche estavam repletos de pragas.
Sua expressão fora de horror. Seus olhos se esbugalharam e o vômito era evidente.
Correndo para o banheiro, David ligou a torneira para lavar sua boca. A princípio, a água a estava limpando. Porém, de repente, sua língua e bochechas começaram a se corroer, deformando-se: Não era água e,sim, ácido.
Os gemidos foram altos e a agonia era muita. Dando passos para trás, se revirando para tentar suportar a dor, ele tropeçou na banheira e caiu dentro da mesma cheia d’água que, em segundos, transformou-se em chamas, queimando-o brutalmente. Os gritos eram altos e afinavam-se pela dor das queimaduras.
Seu corpo estava sendo carbonizado.
Quase morrendo, David abriu seus olhos e observou á sua frente: Um ser nu, com o corpo escuro, perfurado – cujas larvas saíam - e totalmente em estado de decomposição, de cabelos longos e desarrumados – cujo tampavam os olhos -. Este segurava um livro negro em suas mãos distorcidas.
Era ele: Edward Robinson, que presenciou os últimos momentos de David, antes que se transformasse em cinzas. Antes que se juntasse ao seu lado.
O livro voltara para o cemitério.

- E essa foi mais uma história que faz parte da Lenda do Livro Negro – Diz o professor Roger aos seus alunos.
- E essa lenda é real? – questiona um dos alunos.
Roger permanece em silêncio por alguns segundos e, logo após, responde:
- É claro que não. É apenas uma história contada e criada pelo povo. Fantasmas e bruxas não existem!
Ao final da aula as crianças começam a sair, enquanto Roger permanece na sala, refletindo: As crianças jamais poderiam saber que não é apenas uma lenda. Que realmente aconteceu. E que eu fui o zelador do cemitério onde David trabalhava e que, após sua morte, eu escondi o livro no sótão de minha casa, para que mais ninguém o lesse. Para que ninguém mais se tornasse uma vítima, assim como David se tornou.
De repente, seu celular toca: Era sua esposa.
- Oi amor, o que você quer? Eu ainda estou na escola.
- Oi amor, é que eu estou curiosa. Há pouco, encontrei um livro estranho no sótão de casa. Estava sujo e parecia ter manchas de sangue. Não sabia sobre o que era e comecei a ler. É horrível! Aonde você o comprou?
Roger desliga o telefone e, desesperadamente, corre para sua casa para salvar sua esposa, pois ele sabia que aqueles que lerem o Livro Negro estarão com seus destinos traçados. Infelizmente, sua esposa já estava condenada a morte.
A maldição seria cumprida.

Fim
Escrito por Valdir Luciano, 2007


4 comentários:

  1. Duas coisas.
    Primeiro dizer que você é muito benvindo no ideia subalterna. Sua presença ali me deixa muito feliz.
    Segundo, reconhecer que você já é um escritor, sabe criar suspense e contar uma história. Em frente!

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  2. Muito obrigado Edgard por suas palavras, que são de grande importância para minha pessoa. Seja bem Vindo ao meu humilde Blog!

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  3. Gostei muito da historia valdir, se pudesse acrescentar algo que o tornaria mais real, colocaria os trechos do livro em uma lingua mais formal, de norma culta, assim como faziam as pessoas de 1900, te mais vaaldir

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  4. Obrigado Vitória! Boa dica. Uma linguagem mais culta, típica 1900 poderia deixar a leitura bem mais convincente.

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